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Nobel da Literatura escreveu poema a Amália Rodrigues
O escritor Wole Soyinka escreveu um poema à fadista Amália Rodrigues, intitulado Fado Singer, que lhe ofereceu quando a conheceu, através do então primeiro-ministro Mário Soares. Prémio Nobel da Literatura em 1986, o autor nigeriano disse que foi um dos momentos mais bonitos da sua vida, durante a sua participação no FOLIO – Festival Literário Internacional de Óbidos, no dia 15 de Outubro.
Wole Soyinka contou que ouviu fado, pela primeira vez, numa loja de música, e gostou tanto que comprou o disco de Amália Rodrigues. “Um dia, estava em Paris e vi um póster de um concerto da Amália Rodrigues. Entrámos e ela estava a terminar a atuação. Ficámos especados a olhar”, recordou. “No fim, fomos aos camarins e ela disse que nos viu e sabia que queríamos que cantasse para nós.”
Aos 88 anos, o primeiro africano a ter vencido o Prémio Nobel manifestou-se preocupado com os “lunáticos e homicidas que estão a subjugar uma grande parte da humanidade”, dando como exemplos o presidente russo Vladimir Putin, por ter invadido a Ucrânia, o ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump e a situação “inaceitável” vivida no Irão. “As mulheres não deviam ter de lutar para serem consideradas seres humanos”, observou.
“Isto não acontece apenas na Nigéria. É a expressão de uma corrupção muito mais global”, alertou Wole Soyinka. “Veja-se o fenómeno das migrações, devido à negligência dos líderes. Há uma praga global, uma degradação da humanidade. Existe um certo nível abaixo do qual não é possível conceber uma humanidade digna”, lamentou. “O mundo e a minha nação estão a derivar para tornar o que é inaceitável à norma, e isso é um nível de degradação que é muito difícil de aceitar, mas temos de sobreviver.”
Autor de 30 peças de teatro e de três romances, o último dos quais publicado em 2020, com o título “Crónicas do Lugar do Povo mais Feliz da Terra”, Soyinka revelou que este livro, publicado 50 anos depois do romance anterior, resultou da “crescente insatisfação” que sentia com o que tinha escrito até então. “Parecia que não me expressava nos instintos humanistas. Senti essa necessidade de fazer uma coisa de forma diferente, devido a esta desintegração em que o país se encontrava.”
22 meses na solitária
Detido 27 meses, 22 dos quais na solitária, o prémio Nobel da Literatura nigeriano disse que o mais difícil foi ser privado da leitura e da escrita. “Esse período obrigou-me a recorrer aos meus recursos mentais para não enlouquecer. Tive de criar o meu próprio mundo”, contou. Além da atividade física, praticava exercícios de matemática, que o ocupavam “muito tempo”, e usava papel higiénico para escrever poemas, com café.
O escritor conseguiu ainda ter acesso aos livros que se encontravam no gabinete do diretor da prisão, que eram depois devolvidos, sem que este soubesse. “O principal era sobreviver mentalmente”, explicou. Um dos momentos que recordou foi a chegada do homem à lua, em 1969. “Na minha mente, vi Armstrong a saltar de um ponto para o outro”, afirmou.
Com a aproximação do fim da Guerra Civil, começou a ser exercida pressão para o libertarem, o que foi anunciada quatro vezes. “Saí muito revoltado, mas, depois de o governo ser derrotado, o chefe do executivo contactou-me e pediu-me desculpa”, contou. “Tornámo-nos amigos e enterrámos a questão. Eram tempos de guerra e ele não foi o homem responsável por assinar a detenção.”