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RETRATO DO AUTHOR EM TALHA POETICA

CABELLO hirsuto, aonde os lizos pentes

Á força furão; testa apoquentada;

Sobrancelha, e pestana carregada;

Olhos pardos, em alvo globo assentes:

Longo, adunco nariz; quebrados dentes;

Redonda a barba; a face a bochechada;

O colo em conta; a espadoa dilatada;

Bojuda a pança; os braços concernentes:

Cintura á proporção; coxa roliça,

Que quando ao meu espelho me vou pôr

A julgo ou de argamassa, ou de cortiça;

Delgada a perna, por igual theor;

Este o retrato: farte-se a cobiça,

De quem busca o retrato do Author.
POESIAS DO DR. FRANCISCO MANUEL GOMES DA SILVEIRA MALHÃO

ODE A MARCIA

Amor vive n’alma

De Marcia escondido,

E Marcia em amor

Se tem convertido.

Dos olhos a Deos

As settas nos chove;

Se falla, Cupido

A lingua lhe move.

As Graças de roda

As azas pulsando,

Dos beiços rosados

Se estão pendurando.

Ás vezes as tranças

Lhe ennastrão com flores,

Que alegres ministrão

Contentes amores.

Rendidas vontades

Aos pés lhe suspirão,

Ardentes desejos

Em torno lhe girão.

Mas tanto as lições

Tem delle aprendido;

Que até se fez duro

O novo Cupido.

ODE A MARCIA Amor vive n’alma De Marcia escondido, E Marcia em amor Se tem convertido. Dos olhos a Deos As settas nos chove; Se falla, Cupido A lingua lhe move. As Graças de roda As azas pulsando, Dos beiços rosados Se estão pendurando. Ás vezes as tranças Lhe ennastrão com flores, Que alegres ministrão Contentes amores. Rendidas vontades Aos pés lhe suspirão, Ardentes desejos Em torno lhe girão. Mas tanto as lições Tem delle aprendido; Que até se fez duro O novo Cupido.

CABELLO hirsuto, aonde os lizos pentes Á força furão; testa apoquentada; Sobrancelha, e pestana carregada; Olhos pardos, em alvo globo assentes: Longo, adunco nariz; quebrados dentes; Redonda a barba; a face a bochechada; O colo em conta; a espadoa dilatada; Bojuda a pança; os braços concernentes: Cintura á proporção; coxa roliça, Que quando ao meu espelho me vou pôr A julgo ou de argamassa, ou de cortiça; Delgada a perna, por igual theor; Este o retrato: farte-se a cobiça, De quem busca o retrato do Author. Filho de Dr. Agostinho Gomes da Silveira e de Maria da Conceição Dinis Malhão, o Dr. Francisco Manuel da Silveira Malhão foi o primogénito de uma prole de 12 filhos. Nasceu em Óbidos, muito provavelmente na Quinta da Pegada, no ano de 1757. Francisco ficou célebre pela participação em festas e folguedos na sua juventude, só se matriculando no curso de Leis da Universidade de Coimbra em 1783. Após a conclusão do curso em 1789, estabeleceu-se como advogado em Óbidos. Desencadeado pelo capitão Brito Pegado, contra ele correu um processo no Desembargo do Paço, por causa de uma discussão sobre a venda de carne no açougue da vila. Casou com Josefa Margarida de Oliveira e Gama em 1791, de cujo enlace nasceram 4 filhos. Terá falecido entre 1809 e 1814. Em termos literários, dedicou-se à poesia sentimental e humorística, a traduções, a prosas e a diálogos de crítica. Na sua obra, denota-se a influência da Nova Arcádia, havendo notícia de que manteve amizade com Barbosa du Bocage.

AO SR. DR. AGOSTINHO GOMES DA SILVEIRA, ADVOGADO EM ÓBIDOS

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II. POESIA AO DR. AGOSTINHO GOMES DA SILVEIRA