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Dislexia atinge 125 mil alunos do ensino básico e secundário
Helena Serra, presidente da Associação Portuguesa de Dislexia (APD), apresentou-se, esta quinta-feira, no seminário “A inquietação da leitura para Tod@s” - evento integrado no FÓLIO - Festival Literário Internacional de Óbidos - em representação de “125 mil alunos que estão sentados nas salas de aula do [ensino] básico e do secundário”. A docente defendeu a necessidade de intervir junto desta população logo no pré-escolar, para combater esta perturbação na aprendizagem.
“A dislexia é uma dificuldade específica durável, que atinge a leitura e a escrita, porque a pessoa não consegue adquirir esse automatismo”, explicou Helena Serra. “São crianças inteligentes ou superiormente inteligentes, que não têm nenhuma perturbação sensorial. A origem da dislexia é neurobiológica, e atinge a precisão”, acrescentou. A título de exemplo, referiu que há casos em que a palavra “ave” é lida pelo cérebro como “Eva”.
No caso dos adultos, está associado à compreensão, pelo que é comum as pessoas dizerem que não entenderam o que leram. “A leitura é descodificar e compreender em simultâneo”, referiu a docente. Contudo, há pessoas que não conseguem perceber as palavras, apesar de terem muita capacidade. “A causa não está no aluno, mas no contexto”, alertou. Para tal, aconselhou os educadores e os professores a estarem atentos a estas crianças.
A presidente da APD disse que perante a baixa capacidade linguística, a pouca empatia com os professores, os currículos desajustados, a perturbação emocional gerada por todas estas situações, e a baixa cultura das famílias, estes alunos acabam por desmotivar, e por não querer ler, nem estudar. Para o evitar, sublinhou ser fundamental ir ao encontro das suas características, pois é possível ajudá-los a melhorar a aprendizagem.
Barreira no cérebro
“Há uma espécie de barreira no cérebro, devido a um problema no sistema nervoso central”, afirmou a docente. “As letras têm símbolos gráficos e sonoros, e é na associação rapidíssima que o cérebro tem de fazer que o automatismo da leitura vai acontecer”, explicou.
No universo dos 10% de alunos com esta dificuldade, nalguns é mais acentuada do que noutros menos, pois existem diferentes graus de dislexia.
A perturbação de aprendizagem observa-se no défice em leitura, que pode estar associado à escrita, à disortografia ou à disgrafia (movimentos descoordenados na escrita), e que pode levar estes alunos a escrever “estam”, em vez de “estão”. Helena Serra esclareceu, porém, que só 60% têm problemas com a Matemática, pois podem interpretar o número 28 como 82, ou ler o sinal “+” como “-“.
Em relação à fonologia, disse que quando as crianças são desafiadas a dizer palavras com um som semelhante a “botão”, como “João”, algumas não conseguem. O mesmo sucedendo quando os jogos consistem em dizer palavras iniciadas por “f”. Nesse sentido, recomendou aos educadores de infância fazerem estes exercícios nas salas, pois permitem ajudar a identificar casos de dislexia. “Se interviermos cedo a criança melhora o processo de leitura.”
“São crianças com criatividade e inteligentes, mas com as letras não funcionam”, referiu a docente. “Fogem a sete pés dos textos, pelo que tem de haver uma vontade férrea deles e da família, porque têm de ler muito”, aconselhou. “O cérebro funciona de forma diferente, devido a uma alteração dos neurónios”, afirmou. “Conheci um aluno do 9.º ano que, em vez de escrever ‘escola’, escrevia ‘esgola’”, exemplificou. “Cada caso é um caso, mas há um universo de características onde cabem todos.”
Helena Serra destacou ainda o facto de a dislexia ser um defeito congénito no cérebro, e ser hereditário. “É no ensino que a pessoa que trabalha com a criança percebe que há ali qualquer coisa, e tem de a encaminhar para quem possa fazer o diagnóstico, e prescrever exercícios, estratégias e atividades, para poder evoluir nesta função.”
Caso contrário, a atitude nas aulas e na escola será pautada pela desconcentração, desinteresse pelos estudos, timidez, insegurança e inibição, fechamento e isolamento, por não querem que se saiba das suas dificuldades, e, nos casos mais complicados, agressividade, o que se manifesta por atitudes provocadoras, que podem causar indisciplina.
A presidente da APD sublinhou, por isso, a importância de “valorizar ao máximo a produção do aluno”, que na oralidade é sempre muito melhor, por exemplo, não pontuando os erros. “Se a família e a escola não destruírem a sua auto-estima, poderão tornar-se adultos realizados”, acredita.